sábado, 15 de fevereiro de 2014

A arte de se fazer entender




 Edson Moura

Hoje tudo tem um ar diferente em minha vida. Hoje escolhi o que quero fazer para o resto dela. Interessante como mudamos de opinião, aliás, digo mais, a pessoa que não revê suas opiniões de tempos em tempos, está fadado à infelicidade. Já quis ser garçom. Também já quis ser sommelier, fui os dois. Já quis ser motorista já quis ser gerente, os dois também fui. Já quis ser pai, assim como quis ser também um bom filho, dizem que tive sucesso em ambos os casos. Hoje quero ser outra coisa, bem diferente de tudo aquilo que sempre quis ser. Quero ser justo.

Quero “vestir aquela roupa de super-herói” lutar contra tudo e contra todos os que oprimem os inocentes, os desfavorecidos de conhecimentos específicos, os incultos, os sofredores. Quero ser advogado, quero ser juiz, quero ser delegado de polícia, funções estas que têm como principal fundamento, o dever de ser justo. 

Quero entender aquilo que as pessoas não conseguem verbalizar, quero ser seu tradutor para as manifestações mais particulares, mais intimas e mais dolorosas. Aquelas dores que jamais podem ser verbalizadas, pois toda vez que tentamos fazer isso, uma força devastadora, mundialmente conhecida como “lágrimas”, tomam à frente das palavras, e por mais que tentemos tomar fôlego, nada impede que nossa voz se embargue e que os soluços tornem impronunciáveis até as frases mais curtas como; “está doendo muito!”

A arte de comunicar é intrínseca ao advogado. Pois é por meio de sua retórica que os jurados serão tocados profundamente. O advogado é o artista de teatro mais eficaz de todos. Não há sequências de gravação, não há recortes, não há regravação de cenas para que possam ser melhoradas. O improviso impera no seio dos tribunais do júri. É necessário que cada palavra pronunciada por um advogado, seja como uma fecha certeira nos corações dos jurados e dos juízes. É preciso mostrar que aquela dor intraduzível de um réu ou de acusador, pode ser a dor de qualquer um deles. 

Não é preciso mostrar a imagem de uma mãe chorando sobre o caixão de um filho morto. Basta mostrar esta mesma mãe arrumando a cama do mesmo, e fazê-los entender que nunca mais se deitará sobre ela o filho que já não há. Não é necessário uma narração dos fatos, que contenham ideias de terror, de "hediondez" ou de requintes de crueldade. Basta tornar possível que os outros se imaginem no lugar do pai, irmão, ou amigo que nunca mais poderá dizer ao ente perdido: “eu te amo”. Tudo isso se faz com palavras. E quando eu digo “mostrar uma imagem”, não estou falando de uma imagem literal, mas sim de uma imagem mental. Uma cena criada no cerne da mente daquele que tenta se colocar no lugar do outro.

É isso que faz um advogado. Ele tem o poder de transportar seus ouvintes, de sua zona de conforto, para cume de uma montanha, de onde ele, ali, isolado em seus pensamentos, possa ter uma visão mais clara daquele universo, que por vezes lhe é alheia. É preciso causar dor, para que a justiça seja feita, porque do contrário, o que veremos é uma enxurrada de palavras técnicas, totalmente estéreis, sem o mínimo poder de persuasão. Palavras estas que não farão ninguém chorar, na melhor das hipóteses, só os farão... cochilar, demonstrando assim o quão ausente está de suas palavras, a arte de se fazer entender.